Eles querem resultados imediatos. Agora, já. Se possível, pra ontem. Esperar a plantinha crescer? Ai, que chato. Você planta o feijão no algodãozinho, rega. “Mãe, rompeu a casca!”, é a emoção primeira. Incrível. No segundo dia, nasce um brotinho. Legal. No terceiro, a raiz sai pra fora, “vem ver filha!”. Ârrã. No quarto, a criança já não quer regar, nem lembra que o vasinho existe. A planta cresce, ganha um derradeiro olhar benevolente. E a partir daí, haja criatividade da mãe para fazer o experimento continuar interessantíssimo.
É fato: está cada vez mais difícil prender a atenção da garotada usando os métodos que já conhecemos até aqui. Isso ficou claro pra mim no último final de semana, quando presenciei uma cena engraçada num aniversário infantil realizado no Museu de Ciências e Tecnologia da PUC/RS, em Porto Alegre. O lugar é incrível, a organização nota 10 e o acervo de deixar qualquer um embasbacado. Tem tanta coisa pra ver e experimentos para interagir que você pode reservar uma tarde inteira para a visita e vai ser pouco. Mesmo assim, notei monitores rebolando para fisgar os olhares. Falta de preparo? Absolutamente.
Simplesmente, a ansiedade infantil pelo que ainda não se viu supera o prazer de se entregar ao que se está vendo. Há um desinteresse crônico pelo que se tem na mão em prol do efêmero. As crianças de hoje consomem informação e a digerem numa velocidade atroz, está cada vez mais difícil satisfazê-las. Como captar o interesse dessa geração que está sempre a um clique da instantaneidade?
Nossa equipe tinha 12 minicientistas. Cada um recebeu um colete de explorador e orientações para a expedição. Quanta emoção! Impossível conter a euforia diante da visão do gigantesco esqueleto de baleia, em tamanho natural, logo na entrada. De plataforma simuladora de terremoto a vulcão em erupção, era de se supor que os pequenos ficassem vidrados, hipnotizados pelas invenções, teorias e espaços interativos. E eles ficavam. Por dez segundos. Depois disso, uma espécie de bicho carpinteiro virótico irrompia e pernas pra que te quero.
A cena que me marcou foi a seguinte. Pena que não filmei. Já estávamos lá pelo segundo andar, o guia ficou ao lado de uma geringonça com eletrodos. A meninada em volta, feito formiga no mel. “Esta estação mostra como, a partir deste gerador, a lâmpada acende. Este fio conduz a energia elétrica, ao apertar neste botão, o...”. E a criançada saiu correndo para o próximo experimento. Ficamos eu e o monitor lá, nos olhando, eu com a minha cara de espanto, ele com o dedo no interruptor e o sorriso amarelo. E a luz acesa entre nós. Rimos.
Tudo bem, crianças são assim mesmo, a média de atenção vai aumentando com a idade. Não espere que seu filho de 2 anos vá suportar um filme de duas horas no cinema como uma criança de 7. Mas tenho notado que os pequenos têm tido cada vez menos paciência. Minha filha, por exemplo, tem 9 anos e a capacidade de suportar algo que não desperte seu interesse imediato é praticamente nula. E mesmo quando desperta, logo já quer outra coisa. A ponto de chegarmos na pracinha e ela perguntar: “O que vamos fazer depois daqui?”. Vale para tudo: jogos, passeios, estudos.
Será que foi sempre assim? Fiz essa pergunta à minha mãe, se eu e meus irmãos éramos insaciáveis por novidades, difíceis de contentar e de (muito) fácil dispersão. Ela disse que não, ficávamos horas entretidos na mesma brincadeira. E fez uma observação interessante: tínhamos menos opções e estímulos. Os brinquedos eram poucos, mais manuais do que mecânicos. Os jogos em grupo, em geral, predominavam. A interação entre crianças era menos supervisionada, o que dava margem à experimentação genuína, à tentativa e erro, ao autodesafio. Ninguém fazia por você. A infância era um grande show de “se vira nos 30”. Crescer exigia paciência, persistência e foco.
Hoje tudo se tornou descartável, da boneca nova que fascina por uma tarde e no dia seguinte é abandonada ao aplicativo baixado hoje substituído por outro amanhã e outro e outro, a coisa não tem fim. Há um “novo melhor amigo” a cada semana. O álbum da Copa, há crianças colecionando o terceiro exemplar. Completaram o primeiro tão rápido, com tamanha avalanche de pacotinhos comprados pelos pais, que a editora logo se antenou e lançou uma versão em capa dura. Agora há também uns tais cromos. Daqui a pouco vão inventar figurinhas em forma de biscoito para saciar tamanha compulsão juvenil.
Fico pensando nos profissionais do futuro. Um cirurgião tem que ter a máxima concentração, precisão absoluta. Quem vai assumir esse tipo de missão? E como ficarão os relacionamentos sem o lento desvendar dos corações? Com cada vez menor esforço físico e mental, as respostas surgem feito mágica, alimentos pré-cozidos pulam etapas de preparo, nem os mapas necessitam ser desbravados, tornaram-se GPS e antecipam-se às nossas dúvidas alertando-nos: vire à direita, à esquerda, você chegou ao seu destino. Chegamos mesmo? Parafraseando minha filha, “Para onde iremos depois daqui?”.
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