Nunca me
expressei bem oralmente, apesar de ter me tornado professor. As palavras
expositivas jamais corresponderam ao que gostaria de dizer ou ao que eu havia
preparado para tal. As pregas vocais não acompanham com fidedignidade a minha
mente, além de certo bloqueio com o público. O pensamento se faz um pouco mais
completo quando escrevo. No ato da escrita eu tento ser sincero e razoável no
meu pensar, nas minhas reflexões e devaneios. Escrever é uma forma de botar para
fora o urso interior que desperta esfomeado da longa
hibernação.
Eu
assisto admirado aos inúmeros palestrantes marketeiros empresariais, de
auto-motivação, administradores que largaram as suas empresas e se tornaram
oradores profissionais, cobrando milhões por apresentação! Eles brincam com a
retórica, fazem gracejos com a platéia segurando nota de dinheiro, copo com
água, folha em branco. São ovacionados, aplaudidos de pé, prendem a respiração e
a atenção dos ouvintes, além do principal: alienam multidões, vendem seus
incansáveis livros, etc. Apesar de estarem em baixa no momento, vez por outra
surge uma nova celebridade da área e se vai com a mesma presteza com que veio.
Cada um mais arrebatador e inflamado do que o outro!
E como o
brasileiro é um povo que necessita ouvir, precisa de heróis, carece de gente em
que se possa espelhar, tem a auto-estima baixa e anda sempre no vermelho
financeiro, esses retumbantes palradores assumem um lugar de importância magna,
mesmo que seja tossindo clichês, abobrinhas e chavões, porém com um certo estilo
e pompa, jocosamente sábio para a platéia incauta em busca de curas físicas ou
espirituais.
Se todos
os bons livros literários viessem com um apresentador dessa estirpe, a nossa
média de leitura no Brasil subiria vertiginosamente, tenho quase certeza. Já
imaginaram um elegante coroa, perfumado, aparentemente feliz e desinibido
representando oralmente uma tragédia de Sófocles ipsis literis com a
mesma desenvoltura? Ou então uma quarentona loira num tailler falando
sobre as digressões machadianas para o pessoal da terceira idade ou para os
vendedores de seguros? Talvez isso fizesse com que as pessoas despertassem,
pegassem os livros e fossem ler os originais, entretanto aquela seria a
representação oral, marca forte da cultura nacional tupiniquim, de conteúdos
interessantes, ricos, e muitas vezes chato na escrita.
Já
tivemos grandes mestres da “fala”, do “discurso”, como os irmãos Mangabeira, Ruy
Barbosa, os poetas condoreiros, entre eles Castro Alves, só para ficar nesses.
Hoje em dia, quão inebriante não é assistir na nossa região grapiúna, por
exemplo, um Ari Quadros Teixeira, gênio da oratória, relatar para nós uma
historieta qualquer de Malba Tahan, com toda a lhaneza que lhe é peculiar! Ou um
Ruy Póvoas, narrando as lendas e mitos dos povos nagô, queto, jêje e ijexá,
raízes da sua cultura africana. Homens assim faltam em nossas vidas. A
aproximação mais sagaz, embora sem as mesmas características, é o teatro,
encenando de forma bela, caricata e grandiosa a alma humana, com todos os seus
matizes.
O ato de
dizer algo realmente está imbricado com toda a simbologia que nasceu com os
povos latinos: o dizer com as mãos, o dizer com os gestos, o dizer com o corpo,
acompanhando a língua discorrer, extasiando ainda mais o ouvinte concentrado. Eu
de cá na minha pequenez fico só imaginando um Sócrates nas praças e feiras
públicas de Atenas, atacando ferozmente os políticos corruptos, a religião vazia
e a filosofia insípida até aquele momento. Sem falar de Moisés, Jesus, Buda,
Confúcio, Francisco de Assis, Gandhi e muitos outros que jamais escreveram uma
linha, mas falaram, gesticularam e disseram tudo!
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