terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Um café em tom de amizade

Numa mesa debruçada na nossa alçada recorrente, contamos histórias já vividas, teorizações sobre o inicio, meio e fim da existência, e de todos os porquês que lhe são subjacentes. No inicio do nosso fim, contávamos com os pontos nos traços que mais nos importavam, conversa que puxa conversa, numa elevação exponencial de nossa infantilidade, mergulhada numa chama imensa, num tom que rumava ás bebedeiras infernais de cerveja e de risadas pelo entrever de tudo isso mesmo. Longas tardes, manhas ou mesmo noites de pura conversa sobre tudo e sobre nada, efeito de outro tanto de amor e carinho. Essa emancipada, a vontade de nos irmos, de nos saldarmos a outro dia, e então, a uma outra conversa. Mesa utilizada para os engates, bem sei, fizeste parte de alguns, tu próprio pujante por isso meu amigo. Bem tu o sabes o quanto a nossa amizade era importante. Ou se calhar não, se calhar pudesse ao invés de, nunca ter pensado sobre o pensamento, sobre a essência de algo puder ser algo sem esse mesmo algo existir ou pensar-se que pode existir e deixar de o ser e, o mais engraçado, porque assim mesmo a vida o é. Mas não importa, sei bem neste momento, sei mais que ninguém, que a vontade de te abraçar e perguntar pela tua vida e por esses momentos, um mero relembrar diga-se, caso haja mais um pouco de tempo, tirando as eventualidades da vida, um pouco mais de algo a que nos possamos agarrar no futuro. Esse mesmo, eu luto, por mim, por ti, por todos os que já se apoiaram nessas cadeiras gastas e sujas pelo tempo, cadeiras que desaparecem por falta desse algo, um apoio que digna a passagem de uma margem a outra, de um contexto ao outro, de um mundo para outro. Mas como lidar com essa subjetividade, pergunta-se, algo, dentro desse algo, se enumera ao arquétipo de um entendimento, de um colapso cerebral por ler tal semelhante enunciado. Também eu os tive, sabes, por vicissitudes da vida, apontou este retrato, tal que eu os tive mesmo, ainda no mês passado houve o esgotamento que me ia derrubando, inacabado tempo que sustêm a linha ténue do que sentimos, existimos e o porque de tudo não passar de encontros dentro de desencontros. Pois bem, sabes ainda, um longo e moroso processo de identificação que me importunou a sanidade, atirando para um poço depressivo pelo qual luto á sensivelmente três anos, mas tal não é meramente importante quando comparado face ao frio que a cadeira apresenta. Tal não se compara ao não ter estado presente quando devia, ao fumar o cigarro, ou outras coisas menos frequentes e legais. Tudo bem, aceito tal ponto de vista, não tenho de me justificar, mas então, nesse sentido, nem tu tens de ignorar ou dizer simplesmente o vazio silencioso. Fica tudo bem meu amigo. Eu espero por um novo encontro, fico na sombra observando, fico na paz de alma, isto porque, neste tempo tão ausente, construi algo que dificilmente algum dia, jamais alguém, poderá destruir, a minha vontade e força de viver reorientadas para a felicidade e ânsia de bem fazer em prol de algo. Agora, na minha mão, se encontra o desejo de te fazer chegar esta carta, rápida no seu ímpeto, eficaz na sua força e fluidez, espero que a escrita te embale. E então, a amizade é isto mesmo, uma mera teorização sobre algo que constrói um outro algo, que liga a subjetividade de duas, ou mais, pessoas sobre um outro algo, um fabricado a laia da junção dos outros dois.

Fica descansado meu amigo, eu sei que o chão continua no mesmo sítio. Nunca esqueças é a compreensão do significado disso mesmo, nem contudo, e mais importante, da minha ausência. Pensa. Talvez não tenha passado um tanto ou outra demora.

João de Almeida

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