Se fosse feita uma
enquete nas ruas a pergunta "você tem a vida que pediu a Deus?", a
maioria responderia com um sonoro quá quá quá. Lógico que alguém desempregado,
doente ou que tenha sido vítima de uma tragédia pessoal não estará muito
entusiasmado. Mas mesmo os que teriam motivos para estar - aqueles que possuem
emprego, saúde e alguma relação afetiva, que é considerada a tríade da
felicidade - também não têm achado muita graça na vida.
O mundo é habitado
por pessoas frustradas com o próprio trabalho, pessoas que não estão
satisfeitas como relacionamento que contruíram, pessoas saudosas de velhos
amores, pessoas que gostariam de estar morando em outro lugar, pessoas que se
julgam injustiçadas pelo destino, pessoas que não agüentam mais viver com o
dinheiro contado, pessoas que gostariam de a vida social mais agitada, pessoas
que preferiam ter um corpo mais em forma, enfim, os exemplos se amontoam. Se
formos espiar pelo buraco da fechadura de cada um, descobriremos que estão
todos relativamente bem, mas poderiam estar melhor.
Por que não estão?
Ors, a culpa é do governo, do papa, da sociedade, do capitalismo, da mídia, do
inferno zodiacal, dos carboidratos, dos hormônios e demais bodes expiatórios
dos nossos infernizantes dilemas. A culpa é de tudo e de todos menos nossa.
Um amigo meu,
psiquiatra, costuma dizer uma frase atordoante. Ele acredita que todas as
pessoas possuem a vida que desejam. Podem até não estar satisfeitas, mas vivem
exatamente do jeito que acham que devem. Ninguém os força a nada, nem o
governo, nem o papa, nem a mídia. A gente tem a vida que pediu, sim. Se ela não
está boa, quem nos impede de buscar outras opções?
Quase subo pelas
paredes quando entro neste papo com ele porque respeito muito as fraquezas
humanas. Sei como é difícil interromper uma trajetória de anos e se arriscar no
desconhecido. Reconheço os diversos fatores - família, amigos, opinião alheia -
que nos conduzem ao acomodamento.
Por outro lado, sei
que esse meu amigo está certo. Somos roteiristas da nossa própria história,
podemos dar o final que quisermos para nossas cenas. Mas temos que querer de
verdade. Querer pra valer. E este esforço que nos falta.
A mulher que diz
que adoraria se separar, mas não o faz por conta dos filhos, no fundo não quer
se separar. O homem que diz que adoraria ganhar a vida em outra atividade, mas
já não é jovem para experimentar, no fundo não quer tentar mais nada.
É lá no fundo que
estão as razões verdadeiras que levam as pessoas a mudar as coisas como estão.
É lá o fundo que os desejos e as necessidades se confrontam. Em vez de se
queixar, ganharíamos mais se nadássemos até lá embaixo para trazer a verdade à
tona. E, então, deixar de sofrer.
(Martha Medeiros – Cronista
Jornal Zero Hora / Rio Grande do Sul)
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