Com mais cálculos, prova que engloba biologia, física e química exige candidato atento ao conteúdo e à relação do que estuda com o cotidiano.
Foto: Edu Oliveira / Arte ZH
Foi-se o tempo em que a prova de Ciências da Natureza mal exigia cálculo: com o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem, que ocorre em 8 e 9 de novembro) se aproximando dos vestibulares tradicionais, os alunos se veem obrigados a gastar o lápis e destrinchar os números em questões de física, especialmente, mas também de biologia e química. Com uma diferença: entender a pergunta, aplicá-la na prática e avaliar sua relação com as respostas pode levar à solução mesmo sem que se recorra a equações.
Nas disciplinas da natureza, o objetivo é levar os conceitos teóricos para o dia a dia, mostrando sua relação com o cotidiano dos estudantes. Assim, não é raro ser cobrado o cálculo de qual meio de combustível libera menos energia (levantando questões econômicas e ambientais), que se compreenda os kW/h da conta de luz ou por que determinado circuito deixou de funcionar (teorias que podem ser aplicadas em casa). São casos que, mesmo exigindo conhecimentos específicos, podem ser solucionados a partir de experiências pessoais.
Além de interpretar corretamente os enunciados – essencial para a compreensão do que é solicitado –, vale prestar atenção em como aquilo que você pratica cotidianamente pode ser cobrado na prova. Viu um objeto caindo muito rapidamente? Que tal aplicar o que você aprendeu sobre as leis de Newton e calcular a velocidade da queda? Ou choveu e depois veio o sol, logo acompanhado de um arco-íris: por que esse fenômeno acontece?
– O Enem gosta de fazer paralelos mais amplos que os vestibulares tradicionais. Então, o aluno pode identificar os circuitos elétricos na própria casa, pensar em como a lâmpada funciona ou por que um motor elétrico pifou. Não são tantos os cálculos necessários, mas é importante entender as equações para poder chegar aos resultados – comenta Ivan Peixoto, professor de física do Elite Porto Alegre.
Nas provas de biologia e química, não é diferente. E, claro, todas essas matérias podem aparecer juntas, consequência da tão alardeada interdisciplinaridade. Não deixe também de prestar atenção nos fatos atuais e em como eles podem ser cobrados no exame. Lembra da fraude no leite, da recente escassez de água no Sudeste e da epidemia de ebola? Cada uma pode motivar questões – e não só nos enunciados de Ciências da Natureza.
Química
Quer se dar bem na prova? Estude muita estequiometria: palavrinha difícil que define aqueles cálculos necessários para balancear equações químicas. Calcular a concentração de ácido em uma solução ou converter unidades de gramas a mols (ou mililitros) são alguns dos exemplos frequentemente cobrados no exame – comprovando a constatação de que colocar os números no papel tem sido cada vez mais necessário em Ciências da Natureza.
– O primeiro modelo do novo Enem era focado mais na interpretação, com questões longas. Agora está mudando, diminuindo o tamanho da questão e sendo mais objetivo, exigindo o uso de fórmulas – define Evandro Gondran, professor de química no Elite.
Como não poderia deixar de ser, a prova geralmente demanda conhecimento de outras disciplinas: matemática (para os cálculos químicos), biologia e física podem disputar espaço na mesma pergunta. E se os números assustam, não se engane: há muito espaço para a interpretação e – outra característica do Enem – análises de cunho social, ecológico e ético.
– Nas respostas, pode aparecer algo quimicamente plausível, mas que não é a alternativa certa porque não é ética ou ecologicamente correta – explica Eduardo Silva, professor de química no Fênix e no Grupo Unificado.
Eduardo considera ainda que a prova exige muito mais que conhecer variados assuntos de química: é preciso entender a aplicabilidade deles. E entram aí, também, problemas energéticos, sua relação com a natureza e influência cotidiana – aliás, outro ponto forte das provas. Temáticas atuais são uma grande aposta dos professores. Então é bom se preparar: crise no Sistema Cantareira, adulteração de leite e causas e consequências do efeito estufa podem muito bem cair.
– A prova pode falar sobre o contaminante do leite (formol ou ureia), o que é, por que é usado. Envolvendo cálculo, pode dar densidades diferentes para o aluno ver se o leite foi adulterado ou não – completa Evandro.
Biologia
Ecologia, citologia e genética: eis os três assuntos essenciais na prova de biologia do Enem. Eles são bem abrangentes, convenhamos, mas englobam praticamente 70% das provas, conforme o professor de biologia Daniel Meyer. Se por volta de 10 questões estão aí, o restante é loteria: podem ir de fisiologia a saúde pública, passando por biocombustíveis e atualidades. E não basta apenas saber o conteúdo, pois as questões costumam ser bastante interpretativas.
Thiago Pedroso, professor de biologia no Elite, completa: exigindo bastante leitura, biologia é o tipo de prova que ganha o aluno pelo cansaço. Ele recomenda que, em vez de ler a questão na íntegra, o candidato vá direto para o enunciado, entenda o que a questão está pedindo e avalie: se ele domina essa área, pode responder de pronto; senão, talvez seja melhor deixar para depois. Afinal, não é preciso fazer o exame na ordem.
Thiago afirma que assuntos que estão na mídia com frequência têm muita chance de cair no Enem. Entre esses, ele aposta em água, biotecnologia, transgenia, células-tronco, DNA e evolução. O professor Daniel Meyer acrescenta que o noticiário sobre a recente epidemia de ebola pode motivar uma ou mais questões – talvez não somente em biologia.
– Geografia pode cobrar algo mais direcionado a questões políticas, econômicas e sociais do ebola, enquanto em biologia pode cair algo sobre o contágio ou sintomas, sendo mais restrita à doença em si e como ela se propaga.
É importante, ainda, entender que nem todo texto de apoio é fundamental. Thiago explica que algumas questões podem conter informações irrelevantes para sua resolução, então exigem um aluno muito atento.
Física
A prova de física não segue um padrão de distribuição das questões, mas mecânica e energia são temas garantidos. Portanto, prepare seu arsenal de estudos sobre movimento e repouso dos corpos e ação de forças. É bom também saber analisar os tipos de energia, incluindo as renováveis – como maremotriz, eólica e solar –, tanto na forma de produção quanto na sua transformação até chegar ao consumo. Nesses assuntos, o cálculo também pode marcar presença.
– Quando cobram algumas equações, é no cálculo de energia – garante o professor de física do Elite Porto Alegre Ivan Peixoto. – A física é bem diversificada: ano passado, as questões eram mais curtas, com gráficos, enquanto antes o aluno precisava estar mais atento à leitura. É sempre importante saber extrair informações, seja do texto ou de figuras.
As leis de Newton também têm sido bastante cobradas, e é fundamental entendê-las bem. Inércia, dinâmica, ação e reação podem cair em questão própria ou aparecer dentro de outras. Boa parte das contas exige apenas a aplicação de matemática básica, mas é bom ter conhecimento das principais equações. Os professores apostam ainda em pelo menos uma pergunta sobre fenômenos ondulatórios e circuitos elétricos simples.
Alexei Machado Müller, professor da Casa do Concurseiro e do Mathematica Et Cetera, contesta essa tentativa de “contextualizar a física a todo preço” e critica a distribuição da prova que, segundo ele, prioriza poucos conteúdos e dá peso maior para a mecânica. Ainda assim, destaca que a aproximação do Enem ao que é cobrado nos vestibulares tem sido benéfica. Para ele, saber relacionar gráficos, entender movimentos (uniformes e uniformemente variados) e aplicações de hidrostática estão entre as principais exigências da prova.
– Há algum tempo se dizia que o Enem não teria fórmulas nem pegadinhas, mas tem. Devemos encontrar pelo menos três questões que exijam cálculo entre as 15 – acredita Alexei.
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