Depois das grandes tempestades em nossas vidas, às vezes, ao invés da
bonança esperada, costumamos fechar a alma para balanço. E, por mais que
digamos estar disponíveis ao diálogo, bem no fundo do nosso coração colocamos uma
porta.
E esta porta fica tão trancada que, se nós mesmos não a abrirmos,
tornar-se-á quase que intransponível. Como se nossa casa tivesse sido saqueada
e o medo de que fosse arrombada de novo não nos deixasse viver sossegados.
Visitantes cadastrados até poderiam chegar ao jardim... Mas passar da
soleira, quem disse?
E ficamos tantas vezes nos perguntando o porquê de ninguém se aproximar
muito de nós se pensamos, numa atitude de bloqueio à verdade, que estamos dando
espaço para que todos nos visitem.
Fingimos não enxergar o letreiro luminoso de "passagem
proibida" ou os cadeados enormes que colocamos nos portões e nos muros que
erguemos ao redor de nós, porque é duro admitir que temos medo de mais
experiências depois que uma, duas, três ou mil delas não deram certo.
Mas se só as pessoas sensíveis enxergam esse bloqueio, e elas são cada
vez em número menor, as não tão persistentes se afastam com medo de que
soltemos os cães bravos em cima delas e as ponhamos para correr. Assim
acabamos, por comodismo, ficando com as pessoas menos perigosas; com aquelas
com quem sabemos que nunca chegaremos a ter envolvimento maior, até porque sua
percepção não é tão aguçada para penetrar no nosso interior.
Ficamos com aquelas com quem temos menos afinidade e pouco cumplicidade,
principalmente aquela que vem do fundo da alma, porque não queremos que ninguém
invada a fortaleza inexpugnável dos nossos segredos, onde guardamos as mágoas,
os ódios são passados a limpo e os amores mal sucedidos.
Não queremos saber de quem nos leia pensamentos e não pretendemos nos
prender a nada, embora digamos sempre o contrário e saibamos que a falta das
amarras num porto onde poderemos atracar quando estamos à deriva pode
constituir uma bela teoria de liberdade, mas não nos gratifica, pois o ser
humano não nasceu para ficar só.
Nós, hoje, mal ou bem podemos escolher nossos amores e amigos. E que
possamos escolher os melhores, e não os mais cômodos.
E que possamos, também, ter alguns inimigos e, entre os nossos
conhecidos, pessoas incompatíveis conosco, porque são eles que nos ajudam a
superar os nossos limites e nos botam para frente, nem que seja para que lhes
mostremos do que e o quanto somos capazes.
Precisamos ter histórias para contar, sejam elas com finais tristes ou
felizes. Precisamos passar por experiências que nem sempre são gratificantes,
pois uma existência passada em brancas nuvens é uma existência sem frutos.
Um dia, talvez, venhamos a entender melhor os mistérios da vida e, para
chegarmos a um determinado ponto, muitas vezes teremos que passar por vários
obstáculos.
Talvez entendamos que precisamos nos purificar sofrendo várias provações
até conseguir nossos objetivos e receber alguma recompensa.
Algumas doutrinas religiosas e filosóficas tentam explicar porque
algumas pessoas sofrem e outras são poupadas e porque alguns de nós encontram
suas metades e outros passem a vida inteira a procurá-las.
Mas são explicações que talvez nós leigos, não consigamos facilmente
entender. A única coisa que podemos arriscar, é que nada acontece por acaso (ou
será que acontece?).
Talvez, quando sofremos, estejamos passando por um processo de
purificação que nunca será entendido ou aceito por nós enquanto estivermos
vivendo a experiência.
Talvez, quando procuramos alguém ou alguma coisa, estejamos nos
informando; talvez, quando encontramos tanta gente incompatível conosco, é
porque, de alguma maneira, somos ou fomos as pessoas determinadas a surgir em
suas vidas, seja para suportá-la, ajudá-las ou para que, através delas,
aprendamos alguma lição importante: da serenidade à perseverança, da paciência
à fé.
Mas, por mais que apanhemos, que nos escondamos para fugirmos da vida,
de nós mesmos, dos machucados e rejeições... Tudo passa.
O desespero nunca foi solução para nada, pois, afinal, não há mal que
sempre dure e nem bem que nunca acabe.
A vida sempre seguirá dando voltas. Tomara que saibamos aproveitar as
ascensões para levantar quem estiver próximo de nós e as quedas para
aprendermos a ser humildes.
(De Claudia Belucci)
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